- Por Hegle Machado Zalewska
O Decreto Federal n° 10.174/19, no artigo 1° do anexo I, incumbiu ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos o tratamento das políticas e diretrizes voltadas à promoção dos direitos da Pessoa com Deficiência, sendo responsável pela Ouvidoria Nacional em assuntos relativos aos Direitos Humanos.
Se um membro da sociedade civil busca estatísticas sobre violência contra a Pessoa com Deficiência encontra facilmente esse conteúdo apenas no relatório anual do “Disque Direitos Humanos” (Disque 100), divulgado pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH).
O Disque Direitos Humanos foi criado em 1997 com foco no abuso e exploração sexual contra crianças e adolescentes, mas só em 2011 foi lançado o módulo temático de Pessoa com Deficiência.
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De acordo com o MMFDH, dentre os atendimentos com registros de denúncias, manifestações e a disseminação de informações, o registro de denúncias é o serviço mais demandado no Disque 100, representando cerca de 80% do total dos atendimentos.
O relatório mais atual, de 2020, diz respeito ao ano de 2019, no qual foram registradas 12.868 denúncias de violências praticadas contra Pessoas com Deficiência. O grupo ocupa o terceiro lugar, com 8% do total, atrás de idosos (30%), e crianças e adolescentes (55%).
Segundo o referido relatório, as principais violências a que o grupo Pessoas com Deficiência está submetido são: negligência (41%); violências psicológicas (22%) e físicas (15%); abuso financeiro (14%); e violência institucional (4%).
Poucos conhecem a chamada violência institucional (aquela praticada por ação ou omissão dos/as funcionários/as públicos no exercício de suas atribuições profissionais). Essa violência pode assumir diversas formas, como: mau atendimento; recusa em prestar atendimento e orientação; agir de forma discriminatória e preconceituosa; omissão para os relatos de casos de violência.
O fato da negligência estar em primeiro lugar e a violência psicológica em segundo lugar no ranking das violências reforça o indicador que aponta a casa da vítima como o principal local de violações.
Sobre o perfil da vítima, ela apresenta deficiência mental em 58% dos registros. A deficiência física aparece em seguida, figurando em 19% dos casos.
O agressor, na maior parte das ocorrências, é alguém do convívio familiar ou próximo à vítima. 29% das violências são praticadas por um irmão, 17% por filho, 11% pela mãe e 7% pelo pai.
ATENDIMENTO
O Disque 100, o aplicativo Direitos Humanos Brasil e o site da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH) são gratuitos e funcionam 24 horas por dia, inclusive em feriados e nos finais de semana.
O disque 100 categoriza os seguintes tipos de violação relacionados às Pessoas com Deficiência: negligência; violência psicológica; violência física; abuso financeiro e econômico/ violência patrimonial; violência institucional; violência sexual; discriminação; falta de acessibilidade ao meio físico; trabalho escravo; tortura e outros tratamentos desumanos ou degradantes; falta de acessibilidade/meios de informações e comunicações; violação ao direito à memória e à verdade; exploração do trabalho infantil; tráfico de pessoas.
Aplicamos um teste para avaliar o atendimento no aplicativo Direitos Humanos Brasil. Ao preencher o cadastro verificou-se que para receber um número de protocolo e poder acompanhar as providências tomadas a respeito da denúncia o denunciante deveria fornecer seus dados pessoais. Essa é uma das maiores críticas ao sistema de denúncia já que na maioria das vezes as agressões partem de pessoas próximas e o denunciante não quer correr o risco de ser identificado.
Para entender melhor essa necessidade de fornecer os dados pessoais do denunciante entramos em contato via disque 100. O atendimento foi rápido, mas a atendente não sabia explicar como funcionava o aplicativo. Foi questionado o fato da exigência dos dados pessoais para emissão de protocolo já que a denúncia é anônima. A resposta foi bem objetiva: “se você quiser acompanhar as providências decorrentes da denúncia você é obrigado a preencher seus dados”. Perguntado qual órgão tomaria as providências e quais seriam as providências, a atendente não soube responder. Para obter quaisquer informações, os dados pessoais devem ser preenchidos. Agora ficam as perguntas: qual o motivo dessa exigência? Será que essa exigência coíbe de alguma forma os denunciantes?
Delegacias especializadas prestam atendimento, mas o acesso a estatísticas não é público. Pública se torna a realidade da Pessoa com Deficiência quando algum caso degradante é noticiado pela mídia, como foi o caso recente do menino de Campinas/SP, com apenas 11 anos, alimentado apenas com casca de frutas, encontrado nu dentro de um tambor fechado com telha e pia de mármore para evitar fuga. https://revistareacao.com.br/crimes-de-tortura-contra-crianca-com-deficiencia-em-campinas-sp/
Há quantos anos esse menino vem sofrendo maus tratos e tortura? Que denúncias foram feitas e onde? Para muitas Pessoas com Deficiência a denúncia chegará tarde demais.
DENUNCIE! SE UTILIZE DO DISQUE 100, BAIXE O APLICATIVO DIREITOS HUMANOS BRASIL. PEÇA SEU PROTOCOLO PARA ACOMPANHAR A AÇÃO OU OMISSÃO DO PODER PÚBLICO.
- Hegle Machado Zalewska – Advocacy; Comunicadora; Desenvolvedora de Projetos; Produtora de Conteúdo de Políticas Públicas; Advogada Especializada em Direito Digital. e-mail: heglemz@yahoo.com.br
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